Os
recentes reajustes das mensalidades do ensino superior podem deixar
vários estudantes de fora da faculdade, por não terem condições de
pagar, de acordo com estudo feito pela Quero Educação. O levantamento
mostra que enquanto os futuros alunos buscam mensalidades de cerca de R$
500, a média cobrada pelas instituições é R$ 722. Isso faz com que 68%
daqueles que estão em busca de uma formação superior não encontrem
opções viáveis.
O levantamento foi realizado a partir das
buscas feitas na plataforma Quero Bolsa, um dos braços da Quero
Educação. Pela plataforma, estudantes podem obter bolsas de estudos de
5% a 80% de desconto em instituições privadas. Hoje, as bolsas ofertadas
cobrem, de acordo com a Quero, 10% das matrículas nas faculdades. Mais
de 1,3 mil instituições ofertam bolsas de estudo pela plataforma.
Segundo a Quero Educação, no início deste
ano as maiores instituições do mercado praticavam, na plataforma, um
preço médio nas mensalidades de R$ 530, enquanto os alunos buscavam
cursos com preço médio de R$ 526. Ao longo do ano, em meio à queda no
poder de compra, os estudantes passaram a buscar graduações presenciais
com um preço médio de R$ 495, enquanto o valor médio das mensalidades
ofertadas na plataforma foi elevado para R$ 722, representando um
aumento de 45% em relação a faixa buscada pelos alunos.
Se antes as instituições atendiam a 63% dos
estudantes que buscavam vagas, agora essa porcentagem caiu para 32%.
“Não houve aumento do poder de compra dos alunos, eles não podem pagar
esse preço. É isso que a gente vem alertando. Está ficando muita gente
de fora. E o fato é que as instituições não vão conseguir encher as suas
salas”, alerta o diretor da Quero Educação, Marcelo Lima.
Para Lima os descontos nas mensalidades e as
bolsas de estudos são mais vantajosas que os financiamentos, pois podem
garantir a formação dos alunos sem que eles fiquem endividados quando
deixam a universidade. "É uma grande oportunidade para as faculdades que
quiserem trabalhar nesse mercado num preço mais acessível para os
alunos. É uma oportunidade para elas encherem suas salas, porque é muito
melhor ter uma sala cheia de alunos pagando R$ 500 do que ter uma sala
pela metade, conseguindo captar aqueles alunos que estão dispostos a
pagar R$ 720".
Reajustes necessários
Entidades representativas do ensino superior
reconhecem a dificuldade dos estudantes em pagar as mensalidades, mas
ressaltam que os reajustes são necessários, uma vez que muitas das
instituições, durante a pandemia, não aumentaram as mensalidades.
“O
preço é formado com base no custo. Houve, pela inflação, aumento real de
custos nas universidades, aumento de luz, aluguel, correção de
salários”, argumenta o diretor presidente da Associação Brasileira de
Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Celso Niskier. De acordo com
ele, cerca da metade das vagas ofertadas pelas instituições não são
preenchidas.
Segundo o diretor executivo do Semesp, que
também representa as mantenedoras de ensino superior do Brasil, Rodrigo
Capelato, cerca de 30% a 35% dos estudantes têm atualmente algum
desconto ou bolsa. “Em 2023, houve pequena recuperação do setor, mas
sempre com muito desconto, precisando ajustar valores porque o poder
aquisitivo ainda está muito baixo e as famílias estão muito
endividadas”, disse.
Capelato ressalta que não é possível
oferecer descontos a todos os estudantes. “O valor médio das
mensalidades é R$ 800 a R$ 1,5 mil. Senão, não pagamos os custos,
principalmente no ensino presencial”.
Ambos defendem o Fundo de Financiamento
Estudantil (Fies) como forma de manter os alunos e garantir a formação,
já que mesmo com bolsas, eles não têm condições de pagar até o final do
curso. Atualmente, o setor privado concentra 77% das matrículas do
ensino superior brasileiro, de acordo com o último Censo da Educação
Superior. “A gente precisa de uma forma de ingressar via setor privado,
senão não consegue dar cobertura. E a melhor forma é ampliar o
financiamento estudantil”, defende Capelato.
“As pessoas que buscam ensino superior
carecem de financiamento estudantil, um novo Fies até para retomar o
caráter social que defendemos, como era da origem. No Brasil, se não
tiver financiamento com esse caráter, vai ter mais gente precisando
fazer curso superior e não conseguindo”, defende Niskier.
Qualidade
Para os estudantes, é importante que o
ensino ofertado seja de qualidade, o que muitas vezes não tem ocorrido,
de acordo com a coordenadora de Comunicação da União Nacional dos
Estudantes (Une), Manuella Silva.
“A gente precisa, nesse momento, para além
de garantir que estudantes tenham acesso ao ensino superior, garantir a
qualidade do ensino superior. O que nós vemos é o lucro acima da
qualidade”, disse.
Segundo Manuella, a UNE recebe reclamações
de estudantes que acabam tendo aulas gravadas há muitos anos, já
desatualizadas, que não tem laboratórios para práticas, entre outras
reclamações.
Sobre os reajustes, a estudante ressalta que
os aumentos estão recaindo não apenas para os estudantes que estão
ingressando na universidade, mas para aqueles que já estão matriculados e
que acabam não tendo condições para se manter estudando.
De acordo com Manuella, a UNE defende, além
de um Fies que consiga assegurar que os estudantes concluam os cursos,
uma garantia de emprego, para que possam, assim que formados, quitar
suas dívidas com o programa.
“A gente defende o Fies, mas defende que ele
consiga garantir o pleno emprego, para que os estudantes consigam ter
acesso ao mercado de trabalho. O Fies é importante para garantir entrada
na universidade, mas que seja um Fies que os estudantes consigam
entrar, permanecer e concluir um curso com qualidade, que não o deixem
pela metade”, defende.
Fies
Atualmente, o Fies está sendo discutido em
um grupo de trabalho criado pelo Ministério da Educação. As discussões,
em tese, terminam em setembro. A Portaria 390, que oficializou o grupo
de trabalho, foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) no dia 8 de
março, com a finalidade de promover estudos técnicos relacionados ao
Fundo, como diagnósticos sobre a situação atual do Fies, a reavaliação
do limite de financiamento e a desburocratização do programa.
Criado em 1999, o Fies oferece financiamento
a estudantes de baixa renda em instituições particulares de ensino a
condições mais favoráveis que as de mercado. O programa, que chegou a
firmar, em 2014, mais de 732 mil contratos, sofreu, desde 2015, uma
série de mudanças e enxugamentos. Em 2019, foram cerca de 67 mil
ingressantes no ensino superior pelo Fies.
Um dos principais motivos para as mudanças
nas regras do Fies, de acordo com gestões anteriores do Ministério da
Educação, foi a alta inadimplência, ou seja, estudantes que contratam o
financiamento e não quitam as dívidas após formados. O percentual de inadimplência registrado pelo programa chegou a atingir mais de 40%, de acordo com dados do ministério, de 2018.Post: G. Gomes
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Informações: ebc