Imagine
uma manhã movimentada em uma avenida de trânsito rápido. Tentando
entrar no fluxo, um motorista que está atrasado para o trabalho fica
impaciente e acelera. Na faixa rápida, uma motorista recebe uma
notificação pelo celular: um recado urgente da babá informa que seu
filho está com febre.

Desatenta momentaneamente pela notificação,
ela desvia o olhar e não vê a ação do motorista atrasado. Como estava um
pouco acima do limite de velocidade da via (80 quilômetros por hora), a
colisão parece inevitável. Uma batida muito comum no trânsito das
grandes cidades, que gera prejuízos financeiros, estresse,
congestionamento e, eventualmente, vítimas.
Isso, se a colisão tivesse acontecido.
O carro da mulher distraída, no entanto, era
semiautônomo. Graças à tecnologia 5G, ao receber dados de tráfego de
diversos sensores espalhados pelas vias, o veículo soube a hora exata de
desacelerar. Com o uso de inteligência artificial e aprendizado de
máquina, o computador de bordo do veículo conseguiu antecipar a
tentativa frustrada de conversão do motorista atrasado e traçou
possíveis cenários para evitar a colisão.
Sinais sonoros vindos do painel digital
avisaram que havia a necessidade de desacelerar. Com a distração, o
piloto automático assumiu momentaneamente o controle. Em milésimos de
segundo, cerca de 40 sistemas foram consultados e enviaram as
informações necessárias para o reposicionamento do veículo.
O computador de bordo tomou uma decisão:
acendeu a seta e fez um leve desvio de faixa, juntamente com a
desaceleração exata para que o carro se encaixasse no tráfego da faixa
ao lado sem movimentos bruscos. O motorista atrasado sequer tomou
ciência do momento.
Apenas nesta interação de poucos segundos,
cerca de 20 gigabytes de dados foram trocados entre os sistemas. Fotos e
sensores foram analisados, dados foram computados e transmitidos para
outros veículos também conectados e para centrais de controle de tráfego
urbano. A interação só foi possível graças ao 5G, à baixa latência na
troca de informações (tempo de resposta entre o envio e recebimento de
dados) e ao alto fluxo de dados.
Revolução tecnológica
Prevista para estar disponível nas 27
capitais brasileiras até julho de 2022, a internet 5G é vista, tanto
pelo governo federal quanto por empresas de tecnologia e de
telecomunicações, como uma revolução tecnológica abrangente. A
implementação desta tecnologia no Brasil promete trazer diversas
inovações que vão se refletir em maior produtividade, avanços na
economia e na qualidade de serviços.
Em reta final de avaliação
pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o leilão das radiofrequências
que serão utilizadas pela nova geração de internet no Brasil é um passo
importante que está sendo tomado em paralelo a uma série de medidas e adaptações que já vêm sendo articuladas tanto pelo Ministério das Comunicações quanto por operadoras que viabilizarão a novidade.
A chegada da nova tecnologia suscita uma série de questões, muitas delas técnicas e complexas. A Agência
conversou com especialistas da área para entender as novidades que o 5G
vai trazer para a forma como a sociedade navega, produz e consome
conteúdo.
Leilão de frequências
Importante para a implementação do 5G no
Brasil, o leilão das frequências de operação da nova geração de internet
móvel é a porta de chegada dessa tecnologia. Discutido em diversas audiências públicas
ao longo de 60 dias em 2020, o leilão é considerado não arrecadatório,
já que todas as verbas levantadas serão investidas em infraestrutura de
comunicação e aprimoramento da conectividade em áreas ainda carentes.
Segundo o secretário de Telecomunicações do
Ministério das Comunicações, Artur Coimbra, uma das exigências para o
leilão é que haja investimentos não apenas para as redes mais avançadas
de 5G, mas também para habilitar amplamente o 4G em pequenos municípios.
“Esta é a primeira vez que a Anatel [Agência
Nacional de Telecomunicações] fará um leilão que não é arrecadatório, e
sim voltado para investimentos. Todo valor acima do preço mínimo será
revertido para as 2,3 mil localidades que ainda não possuem 4G
habilitado, para as rodoviárias federais e povoados rurais”, afirmou o
secretário, que é um dos responsáveis pela elaboração dos termos do
pregão.
No leilão do 5G, quatro faixas de frequência
serão ofertadas. Destas, duas serão inicialmente híbridas e servirão
para distribuir o sinal 4G e o 5G em variações do espectro. Veja abaixo:
| Faixa | Uso |
|---|
| 700 MHz |
Inicialmente será usada para ampliação do sinal
4G. Eventualmente será a faixa utilizada por sensores inteligentes e
carros conectados |
| 2,3 GHz |
Alta capacidade para áreas densamente povoadas,
também será usada para o 4G e será a frequência padrão de operação para
dispositivos em geral |
| 3,5 GHz |
Capaz de transmitir dados em altíssima
velocidade, pode ser usada em paralelo com outras bandas e deve ser a
faixa mais concorrida do leilão. É considerada parte do chamado 5G standalone |
| 26 GHz | Faixa onde deve acontecer a transmissão de dados
da economia em larga escala, como automação industrial e agrobusiness;
capaz de grande velocidade e também é considerada parte do 5G standalone |
5G - qual a diferença entre as gerações?
Apesar do ganho óbvio no quesito velocidade, a transição para o 5G não será percebida apenas pelas taxas de download ou upload de conteúdo, explica o presidente da Anatel, Leonardo Euler de Morais.
“O 5G vai remodelar a sociedade e os meios
produtivos. Para muito além do que aconteceu quando saímos do 3G,
teremos internet das coisas [IoT, da sigla em inglês], carros autônomos,
cirurgias remotas. O 5G alavanca e possibilita várias outras
tecnologias, como inteligência artificial, realidade aumentada -
tornando cada vez os meios produtivos mais competitivos”, explicou.
Mas qual a diferença entre as gerações da internet móvel? Veja no infográfico:
Baixa latência, alta velocidade
Morais explica que as novas possibilidades
de interação podem transformar a educação, os serviços e a indústria
brasileira, além de capacitar novos mercados de trabalho.
Como exemplos, cursos remotos de ensino
poderão se beneficiar de aulas em realidade aumentada - experiência de
interação em que objetos reais são aprimorados por meios digitais - para
mostrar casos práticos da construção de uma estrutura arquitetônica, ou
para o treino de um piloto de avião, por exemplo. Galerias de arte,
máquinas complexas ou até mesmo o corpo humano podem ser explorados via
realidade aumentada em sessões de aprendizado com centenas de outras
pessoas compartilhando a experiência.
“A realidade virtual e a realidade aumentada
ganham outra dimensão. Você pode ter o professor virtualmente onde
estiver. É possível usar sensores táteis para manusear um órgão humano,
no caso de um estudante de medicina. Um técnico de tomógrafo, por
exemplo, poderia dar assistência na manutenção de uma máquina. São
vários exemplos que mostram que a tecnologia 5G é disruptiva”, explicou.
Todos os cenários citados pelo presidente da
Anatel só são possíveis graças às características inerentes à
tecnologia do 5G, em especial a velocidade de transmissão e recepção de
dados, chamada latência. Ela é a soma do tempo de envio de uma
informação até a resposta do servidor ao qual a conexão está sendo
feita. Em seguida, o envio da resposta do servidor ao cliente com as
novas informações, e assim repetidamente.
Conflito de faixas de operação
Segundo o secretário de Telecomunicações,
Artur Coimbra, cerca de 21 milhões de brasileiros utilizam antenas
parabólicas para receber sinais de telecomunicação em casa - serviço que
usa a mesma frequência de 3,5 GHz que será ofertada para exploração
comercial no leilão do 5G.
“Há uma exigência descrita no edital que é
específica para essa frequência [3,5 GHz]. A gente sabe que a TV por
satélite no Brasil é muito popular e foi necessário pensar em soluções
para isso - o que não sai barato. Felizmente, a parte técnica foi
desenhada e está muito robusta”, disse Coimbra.
A empresa responsável por arrematar a
frequência terá, entre outras responsabilidades, que operacionalizar a
instalação de filtros de sinal e, em determinados casos, a troca da
antena e do equipamento de recepção da banda atual para a chamada banda
Ku. A mudança será feita por meio de um kit especial que será custeado pela operadora da frequência.
Faixa exclusiva
A arrematadora da faixa de 3,5 GHz também
terá um compromisso de segurança nacional: viabilizar uma rede privativa
de comunicação para o governo federal que tenha requisitos de segurança
ampliados e que seja altamente confiável.
Segundo o edital do leilão, duas
contrapartidas deverão ser executadas para criar a rede segura de troca
de dados do governo: uma malha de conexão de fibra óptica entre todos os
órgãos da União e uma rede móvel exclusiva para o uso público. Todas as
telecomunicações do governo, além de serviços de segurança, defesa
civil e emergência, poderão usufruir do serviço, que será implementado
inicialmente no Distrito Federal.
Infraestrutura complexa
O secretário de Telecomunicações também
listou os desafios de preparar a infraestrutura dos grandes centros
urbanos para o recebimento da tecnologia 5G. “Teremos dois desafios
logísticos com o 5G. O primeiro é a complexidade do licenciamento
[urbanístico] para implantação de antenas. Vamos precisar ter cerca de
dez vezes mais antenas do que com tecnologias anteriores”, argumentou.
As antenas de transmissão do 5G, no entanto,
trazem uma vantagem. Por serem pequenas, explica Artur, poderão ter
regras especiais de isenção de licenciamento urbano - o que agilizaria o
processo de cobertura da tecnologia. O problema do licenciamento
urbanístico é que ele acontece na esfera municipal, e há grande variação
nas legislações sobre o tema.
“O segundo ponto é a expansão das redes de
fibra óptica que alimentarão essas antenas. O próprio edital prevê o
aumento da malha de cobertura da fibra óptica e a substituição da
infraestrutura antiga, mas é um processo demorado”, argumentou Coimbra.
Informações: ebc
Post: G. Gomes
Home: www.deljipa.blogspot.com