Previsto
para ser lançado na próxima quarta-feira dia 28 de Junho de 2023, o Censo 2022 do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) esteve a um passo
de ser comprometido. A falta de apoio para acesso dos recenseadores a
áreas remotas ou carentes e resistência de alguns cidadãos abastecidos
por notícias falsas por pouco fizeram o equivalente a quase um estado do
Rio de Janeiro deixar de ser contado.

Ao longo dos últimos três meses, sucessivos
mutirões do IBGE e do Ministério do Planejamento conseguiram reverter a
situação. Uma série de forças-tarefas incluiu, de última hora, 15,9
milhões de brasileiros no censo. Ao todo, foram três operações
especiais. A primeira buscou alcançar brasileiros na Terra Indígena
Yanomami, que nunca tinham sido recenseados. As outras procuraram
reduzir a taxa de não resposta em dois ambientes opostos, mas com
resistência a recenseadores: favelas e condomínios de luxo.
“Nesta semana, vamos deixar para trás
informações de 13 anos atrás, do Censo de 2010. Para formular políticas
públicas, conhecer as demandas da população e atuar em emergências,
precisamos de informações atualizadas. O recenseamento é essencial para
conhecer quem somos, quantos somos e como somos hoje. Não como éramos”,
diz o assessor especial do Ministério do Planejamento, João Villaverde.
Indígenas
Realizado em março, o recenseamento na Terra
Indígena Yanomami incluiu 26.854 indígenas no censo, dos quais 16.560
em Roraima e 10.294 no Amazonas. O mutirão foi essencial para atualizar a
população indígena no Brasil, estimada em 1,65 milhão de pessoas
segundo balanço parcial apresentado em abril. O número completo só será
divulgado em julho, quando o IBGE apresentará um balanço específico do
Censo 2022 para a população indígena.
A operação na Terra Yanomami foi complexa, mas conseguiu, pela primeira vez na história, recensear 100% da etnia no território.
Por envolver dificuldades de acesso a aldeias aonde só se chega de
helicóptero, o mutirão foi coordenado por cinco ministérios e reuniu 110
servidores federais dos seguintes órgãos: Polícia Rodoviária Federal,
que forneceu os helicópteros; Ministério da Defesa, que forneceu o
combustível; guias do Ministério dos Povos Indígenas; servidores da
Secretaria de Saúde Indígena da Fundação Nacional dos Povos Indígenas
(Funai); além dos próprios recenseadores do IBGE.
Realizado de 7 a 30 de março, o mutirão foi
necessário porque o recenseamento tradicional não conseguia chegar a
todas as aldeias yanomami. Por causa das operações para retirar os
garimpeiros e do remanejamento de helicópteros para as ações de resgate
humanitário, o censo teve de reduzir o ritmo em fevereiro, quando cerca de apenas 50% da população do território havia sido contabilizada.
Favelas
Nas favelas, o censo esbarrava em outras
dificuldades. Além da falta de segurança em alguns locais, muitos
moradores não queriam abrir a porta para o recenseador porque tinham
recebido falsas notícias de que teriam benefícios sociais cancelados.
Outro problema, principalmente em áreas mais densas, era a falta de endereços nas comunidades.
Muitas vezes, os recenseadores não tinham informação sobre novas
moradias surgidas nos últimos anos, como puxadinhos e lajes num mesmo
terreno.
“O que impedia a entrada dos recenseadores
na favela era a falta de conexão dos recenseadores e do Poder Público
com as pessoas que moram lá. Além disso, havia a falta de
conscientização das pessoas por falta de uma explicação que alcançasse
os moradores das favelas da importância do censo e de respostas sinceras
e objetivas”, analisa o Marcus Vinicius Athayde, diretor do Data Favela
e da Central Única adas Favelas (Cufa), que auxiliou o IBGE no mutirão.
O mutirão começou no fim de março, com o lançamento de uma campanha na Favela de Heliópolis, em São Paulo,
do qual participou a ministra do Planejamento, Simone Tebet. A operação
ocorreu em 20 estados e registrou aglomerados subnormais (nomenclatura
oficial do IBGE para favelas) em 666 municípios. O número de habitantes
só será conhecido em agosto, quando o IBGE divulgará um recorte do Censo
2022 para as favelas.
Segundo Athayde, a Cufa ajudou primeiramente
por meio de uma campanha chamada Favela no Mapa, que usou as lideranças
estaduais da entidade para conscientizar os moradores de favelas da
importância de responder ao censo. Em seguida, a Cufa recrutou moradores
de favelas e lideranças locais para atuarem como recenseadores e
colherem os dados das comunidades onde moram. Também houve mutirões de
respostas em eventos comunitários.
“Responder ao censo traz benefícios de volta
para o morador da favela, para seus vizinhos, para sua família, na
medida em que o governo e as políticas públicas atuarão de forma mais
adequada para essa população”, destaca Athayde.
Condomínios
Por fim, o último flanco de resistência a
recenseadores concentrava-se em condomínios de luxo, principalmente em
três capitais: São Paulo, Rio de Janeiro e Cuiabá. “Historicamente, a
taxa de não resposta, que é o morador que não atende ao recenseador,
fica em torno de 5%. Isso em todos os países que fazem censo. Nessas
três cidades, a taxa estava em 20% em condomínios de alto padrão”, conta
Villaverde, do Ministério do Planejamento.
No Censo 2022, a média nacional de não respostas estava em 2,6%
segundo balanço parcial divulgado em janeiro. No estado de São Paulo,
alcançava 4,8%, principalmente por causa da recusa de moradores de
condomínios de renda elevada.
Para contornar os problemas, o Ministério do
Planejamento e o IBGE promoveram uma campanha maciça em redes sociais.
Parte das inserções foi direcionada a sensibilizar porteiros, que
obedecem a regras restritas para entrada de estranhos. Outra parte
esclareceu que síndicos não têm o poder de proibir o morador de receber o
IBGE. “Muitas pessoas queriam atender ao censo, mas não sabiam que o
recenseador não tinha vindo porque o síndico vetava”, recordou
Villaverde. Também houve reportagens de quase 10 minutos em televisões
locais sobre o tema.
Segundo o assessor especial do Planejamento,
a mobilização foi um sucesso. “Em uma dessas três capitais, conseguimos
reduzir a taxa de não resposta para menos de 5% em condomínios de alta
renda”, diz. A operação para os condomínios começou em 14 de abril e
estendeu-se até 28 de maio, último dia de coleta de dados para o Censo
2022.
Entraves
A realização do Censo 2022 enfrentou
diversos entraves. Inicialmente previsto para 2020, o recenseamento foi
adiado por causa da pandemia de covid-19. Em 2021, o Supremo Tribunal
Federal (STF) obrigou o governo anterior a realizar o censo em 2022.
Na época, o Ministério da Economia autorizou
R$ 2,3 bilhões para o censo, mesmo orçamento de 2019 que desconsiderava
a inflação acumulada em dois anos. Com a coleta de dados iniciada em 1º
de agosto, o Censo 2022 inicialmente estava previsto para encerrar-se
em outubro do ano passado. Com dificuldades para a contratação, o
pagamento e a manutenção de recenseadores, o fim do censo foi
primeiramente adiado para fevereiro deste ano.
Com falta de verba e alta proporção de não
recenseados, o governo atual decidiu fazer uma suplementação
orçamentária de R$ 259 milhões ao IBGE. O Ministério do Planejamento
também decidiu seguir a recomendação do Conselho Consultivo do IBGE,
formado por ex-presidentes do órgão, demógrafos e acadêmicos, e estender
a coleta de dados até o fim de maio. Em abril, uma série de
remanejamentos internos no órgão evitou um novo pedido de verbas pelo
IBGE.
Desde 29 de maio, o IBGE está rodando os
dados, para a divulgação na próxima quarta-feira. “No início do ano, o
ministério tomou a difícil decisão de seguir 100% das recomendações do
Conselho Consultivo porque os dados colhidos até então não garantiam a
qualidade do censo. Agora, com as operações especiais e o tempo extra de
coleta, temos a certeza de que o recenseamento está robusto e em linha
com os parâmetros internacionais de qualidade”, diz Villaverde.Post: G. Gomes
Home: www.deljipa.blogspot.com
Informações: IBGE